quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Caminhos

"Há nesta época dois caminhos a seguir: um, estrada larga, batida, plana, sem peripécias, mas que conduz à prostituição da inteligência; outro, vereda estreita, tortuosa, mal gradada, mas que se dirige ao aplauso da própria consciência. Aqueles cujas esperanças não vão além das sombras do cemitério e aí vêem, não o termo de sua peregrinação na terra, mas o remate da existência, que sigam a estrada. Nós, porém, que guardamos para além da vida as nossas melhores esperanças, tomaremos o bordão do romeiro e iremos rasgar os pés pela vereda de espinhos" Alexandre Herculano

É uma característica minha, quem me conhece sabe: adoro conhecer novos caminhos. Dono de um raro senso de direção, e que dificilmente falha, não me contento em conhecer um único caminho para determinado lugar. Meto-me por ruelas, estradas, ladeiras e becos, confiando nesse instinto. Nem sempre descubro o “melhor” caminho (“melhor” é o que todos consideram o mais rápido, seguro, econômico e tranqüilo). Muitas vezes chego a ruas sem saída, contra-mão ou outro desses empecilhos dos caminhos. Mas não desisto.

Nessa viagem de férias, logicamente abusei de tal hábito e como sempre muitas vezes tive gratas surpresas: depois de enfrentar uma sinuosa estrada pela serra descobri a pequena e linda praia de Almada, em Ubatuba. Também quando me meti num caminho esburacado e descobri uma linda cachoeira, num lugar chamado Lídice (alguém já ouviu falar?), na estrada que liga Angra dos Reis a Volta Redonda.

Foi esse hábito que me levou à Fazenda da Barra, perdida num socavão da Serra da Bocaina. Pousei ali, naquele casarão de 1840, único hóspede dos 9 quartos, ouvindo tão somente o rumorejo das duas cachoeiras que cercavam a sede. Mas vi algo que há anos meus olhos não viam: vagalumes-açu, grandes e luminosos como pequenas lâmpadas que acendiam no breu da noite.

Claro que tudo isso foi um couvert para o assunto que quero tratar hoje: os caminhos que fazemos na vida. Simplificando ao máximo, a Vida é o trajeto que percorremos entre o nascimento e a morte. Há diversas maneiras de segui-lo, e isso todos vocês bem sabem, não vai aqui nenhuma novidade. Podemos seguir pela estrada pavimentada, com quatro faixas, bem sinalizada, telefones a cada quilômetro, postos de serviço de quando em quando. Muito cômodo, muito bom, uma viagem agradabilíssima.

Mas existem outros caminhos, aqueles escondidos, de terra, com atoleiros e buracos, margeando pirambeiras ou subindo serras que dão nós no estômago. Certamente que não são os mais confortáveis e seguros, mas nos reservam cada surpresa! Aqui é uma majestosa paineira vestida de flores rosas, que caem mansamente num ribeirão de águas límpidas, a correr entre as pedras verdes de limo. Numa curva, surpreende-nos o atroar de uma enorme cachoeira, e somos atingidos no rosto pelo véu de água que se forma na queda. E por aí vai.

Nenhum dos caminhos está livre de incidentes: um pneu furado, uma pane no motor, falta de combustível. São coisas que independem de nossa vontade. A nós cabe unicamente decidir pelo itinerário, qual a velocidade, quem segue conosco. Alguns desertam antes do final, mas outros surgem de carona, e assim continua a viagem.

De minha parte, ainda que não tão fáceis, prefiro os caminhos marginais (não no sentido de criminosos, por favor. Marginais que margeiam, paralelos), ao invés do caminho de toda gente, porquê assim o fizeram o pai, e o avô e todos os mais.

Seguir novos caminhos, parando aqui e ali pra admirar o azul das montanhas, que mais se afasta quando dele nos aproximamos, ou apreciar um pôr-do-sol sentado na raiz de uma centenária figueira, enquanto um arisco tié-sangue voeja entre a vegetação.

Sigam seu caminho da maneira que melhor prefiram, e que o percurso que hoje se inicia seja feito de trechos alegres e especiais.

Boa Semana!

Um comentário:

Kandy disse...

Que bom que você apareceu no meu caminho (ou será que fui eu no seu?)
Bjos